Se bem conduzidas, as crises podem ser grandes oportunidades para empresas amadurecerem, aprendendo com os próprios erros e promovendo mudanças relevantes para si, para o mercado e para a comunidade.
A Serra Gaúcha ganhou projeção nacional após a descoberta de que trabalhadores terceirizados da colheita da uva estavam submetidos a condições análogas à escravidão. A empresa que cometeu o crime prestava serviço para grandes vinícolas da região, que vieram a público prestar esclarecimentos. Em suas notas oficiais, disseram desconhecer as irregularidades.
Em uma gestão de crise, a primeira impressão é a que fica e é a que ganha maior repercussão. É necessário ter agilidade e assertividade na primeira manifestação pública. Não é possível minimizar o fato ou se eximir da responsabilidade.
Minha empresa está com a imagem em crise, o que devo fazer?
O primeiro passo para as organizações envolvidas em uma crise é reconhecer publicamente o erro e assumir sua participação no ocorrido. Este é o momento de se mostrar genuinamente preocupado com o que aconteceu e, sobretudo, agir para solucionar o problema.
O segundo passo é se propor a prestar assistência imediata às vítimas e se colocar ao lado delas ao apontar o que pode ser feito para auxiliá-las. Elas terão seus direitos assegurados? Terão o apoio psicológico necessário? Seus algozes serão responsabilizados?
O terceiro passo é formar um comitê de crise para estabelecer novas políticas e protocolos internos rigorosos, para que esse tipo de situação não se repita.
O quarto passo é escolher um porta-voz que falará em nome da organização, para humanizar a comunicação com o público. A manifestação apenas por meio de notas oficiais é uma maneira fria, distante e impessoal de se posicionar. Para preservar a sua reputação, a empresa deve ser rápida, transparente e proativa, convocando uma coletiva de imprensa, abrindo as suas portas para apresentar a sua história e índole, com base nos seus processos e trajetória, além de dar voz a colaboradores e stakeholders através de depoimentos, para que compartilhem as suas experiências ao trabalhar com aquela companhia.
E por fim, as empresas devem ter uma postura propositiva e criar ações afirmativas de combate ao que lhes gerou a crise, com programas internos de capacitação, de educação ao mercado e à comunidade, e a promoção de campanhas de repúdio e conscientização sobre o tema.
Exemplos de empresas que souberam gerenciar sua crise de imagem
Os passos que cito aqui são essenciais para uma boa gestão de crise, mas é importante que você tenha em mente que, se isso está acontecendo com a sua empresa, somente uma boa equipe de assessoria de imprensa e gestão de crise pode te auxiliar a atravessar esse período nebuloso. Estude sobre o assunto, veja exemplos de casos como os que vou apresentar aqui abaixo, mas principalmente cerque-se de profissionais experientes.
Uma boa equipe terá visão sistêmica e estratégica, apontando os melhores caminhos. Além disso, será ágil na comunicação, terá contato direto com os veículos de imprensa e será a ponte entre os jornalistas e o seu porta-voz, guiando-o para enfrentar a situação da melhor forma possível.
Conheça abaixo alguns exemplos de um bom gerenciamento de crise!
O caso de racismo do Starbucks
Em abril de 2018, o Starbucks passou a enfrentar um forte boicote à marca após um caso de racismo em uma de suas lojas nos Estados Unidos.
Dois homens negros que aguardavam um amigo dentro da cafeteria pediram a um dos atendentes se podiam usar o banheiro, este negou e pediu para que os clientes se retirassem da loja. Com a recusa deles, o atendente chamou a polícia e os dois homens saíram algemados para a delegacia.
Isso teria acontecido com clientes brancos? Provavelmente não. E foi isso que os internautas também entenderam. Uma pessoa que estava na loja no momento do ocorrido gravou todos os acontecimentos e divulgou nas redes sociais. Rapidamente o vídeo se espalhou e o boicote ao Starbucks pelo caso de racismo foi instaurado.
Quais foram as medidas para gerenciar a imagem em crise?
Contra fatos, não existem argumentos e o Starbucks entendeu isso rapidamente. Ao ficar ciente do acontecimento, a empresa emitiu um comunicado oficial, em nome do CEO, Kevin Johnson, se desculpando pelo fato, assumindo o erro do funcionário e anunciando quais medidas seriam tomadas para que isso não voltasse a se repetir.
Respeitando o segundo passo de uma boa gestão de crise, Johnson também se desculpou pessoalmente com as vítimas e demitiu o funcionário responsável pelo ocorrido. Por fim, a ação prática escolhida para a empresa a fim de evitar que situações como essa voltassem a acontecer, foi a de fechar todas as suas 8 mil lojas no país por uma tarde para que os funcionários recebessem um treinamento sobre combate ao racismo.
Além de agir corretamente em relação às vítimas, ao ter essa atitude o Starbucks conseguiu reverter sua imagem perante à mídia, que passou a divulgar de forma positiva a ação da empresa.
Outro caso, no Nubank
Infelizmente o racismo foi tema de outra imagem em crise, desta vez no nosso país. Em 2020, ao dar uma entrevista ao programa Roda Viva, da emissora TV Cultura, a co-fundadora do banco digital Nubank, Cristina Junqueira, afirmou que tinha dificuldade de contratar pessoas negras para cargos de liderança dentro da empresa por não atingirem os requisitos técnicos esperados por ela. Ao ser questionada sobre sua alta exigência ser uma possível barreira, Cristina afirmou: “não pode nivelar por baixo”.
A declaração causou um alvoroço nos espectadores do programa e rapidamente se espalhou pelas redes sociais.
A solução encontrada
Seguindo um dos principais mandamentos do gerenciamento de crises, o Nubank agilmente veio a público pedir desculpas pela fala de Cristina. Por meio de uma carta, assinada pelos três sócios fundadores, prometeram tomar providências para reparar o erro.
Na própria carta, a empresa afirmou estar conversando com a comunidade negra integrante do banco, com ativistas negros fora da empresa, assim como com os próprios clientes para entender a problemática da questão e de que forma poderiam agir. Dessas conversas surgiu uma parceria com o Instituto Identidades do Brasil, uma organização sem fins lucrativos que desenvolve ações para conscientização da importância da igualdade racial nas empresas.
Seguindo o último passo da gestão de crise, criar ações afirmativas para combater o que criou a crise em primeiro lugar, o banco reforçou sua busca por aprendizado. “O objetivo é ampliar nosso entendimento sobre o tema, firmar nosso engajamento público e contínuo e acelerar a promoção da igualdade racial no Nubank”.
A lição que fica
Os consumidores do século 21 querem conhecer o caráter e se identificar com o propósito das marcas que consomem. Um produto de qualidade não é mais o suficiente para manter a fidelidade dos clientes. O mercado tem a expectativa de conhecer com transparência qual o impacto das empresas e o seu papel na sociedade.
Ou seja, esteja a par dos assuntos caros para a sociedade atual e se posicione claramente em relação a eles. Construa ações concretas dentro da sua empresa para que a crise nem precise chegar. Porém, caso aconteça, esteja pronto para enfrentar as consequências, reconhecendo seu erro e fazendo o que estiver ao seu alcance para que ele não volte a se repetir.